sexta-feira, 8 de março de 2013

Esta é minha homenagem literária ao Dia Internacional da Mulher


Filhas do Cerrado

A cor rosa ilumina as noites de outubro no Congresso Nacional, durante a campanha mundial contra o câncer de mama. A uns oitenta quilômetros dali, em Águas Lindas de Goiás, Matilde, empregada doméstica, está sentada num banco de madeira do lado de fora do posto de saúde. São duas da manhã. Atrás dela, há, pelo menos umas trinta pessoas, todas aguardam a distribuição de senha. Matilde tem os olhos cansados. Faz frio e Matilde sente que as cólicas estão piorando.
A cor rosa ilumina as noites de outubro na Procuradoria-Geral da República, durante a campanha mundial contra o câncer de mama. Patrícia chega assustada. Usa calça jeans e blusa branca. A blusa tem sangue. O marido a agrediu na cabeça com um pedaço de madeira. Os policiais de plantão na delegacia do Gama riem dela e dizem que não podem registrar a ocorrência porque o agressor é policial também.
A cor rosa ilumina as noites de outubro no Palácio do Planalto, durante a campanha mundial contra o câncer de mama. Rosália está desacordada e os enfermeiros a colocam numa maca. Sangue escorre por entre suas pernas. Na emergência do Hospital da Asa Norte, um homem de quarenta anos, cuja cabeça pende para a direita, aguarda atendimento sentado numa cadeira próxima ao banheiro. Um bebê de oito meses chora sem parar. A mãe diz que o intestino dele não funciona há três dias. Horas depois, comunicam à família de Rosália que ela faleceu devido a uma hemorragia provocada por um aborto.